O Direito de Superfície enfrenta desafios legais e divergências interpretativas que impactam a viabilidade de projetos imobiliários e de infraestrutura. Com a proposta de reforma no Código Civil, esses entraves serão solucionados, oferecendo maior segurança jurídica para empresas do setor imobiliário e agrícola.
Autores: Gabriela Vieira Suzin e Juliane Randon Ribeiro
O direito de superfície, introduzido no Brasil pela Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) e consolidado no Código Civil de 2002, é uma ferramenta que permite a separação entre o direito de propriedade de um imóvel e o direito de usar e explorar a sua superfície. O superficiário (pessoa que detém o direito de superfície) pode utilizar a área para seu benefício, podendo extrair lucros, obter frutos e utilizá-la para seu sustento.
Nos últimos anos, o alcance do direito de superfície se expandiu, ultrapassando os limites urbanos e se estendendo ao meio rural. Hoje, o instrumento vem sendo utilizado para viabilizar concessões de uso de terras para atividades agrícolas, criação de animais e até para a instalação de empresas. Além disso, a cessão do direito de utilização da superfície se demonstrou crucial para a instalação de infraestrutura no Brasil de maneira facilitada, sem que seja necessária a transferência da propriedade do imóvel, como para a instalação de linhas de transmissão de energia e torres de telecomunicação.
Apesar do potencial, o direito de superfície enfrenta desafios devido a divergências entre o Código Civil e o Estatuto da Cidade, o que gera diferentes interpretações jurídicas e decisões contraditórias. Além disso, com o surgimento de novas tecnologias, novas questões aparecem, exigindo a reinterpretação do instituto.
Nesse sentido, o Projeto de Reforma do Código Civil (“Projeto”) visa solucionar essas divergências e modernizar o tratamento dado ao direito de superfície. Destaca-se a possibilidade de constituição do direito de superfície por cisão, isso significa que o superficiário poderá adquirir o direito de superfície de um imóvel já construído, podendo ou não – a depender do contrato firmado entre as partes – realizar melhorias ou reformas. Outro ponto importante é a regulamentação da aquisição do direito de superfície pela usucapião, o que já vinha sendo reconhecido pelos tribunais e passa a estar formalizado no texto do Projeto, oferecendo maior previsibilidade e segurança jurídica.
Além disso, o Projeto também inclui a possibilidade de cessão do direito de sobrelevação, que se refere à utilização do espaço aéreo, permitindo que o superficiário construa algo sobre o imóvel, como, por exemplo, antenas de telecomunicação ou novas instalações, sem afetar a estrutura original do imóvel. Esse tipo de concessão tem grande potencial facilitador para a instalação de antenas de telecomunicação em edifícios residenciais e comerciais, além de permitir a expansão das redes de energia elétrica em meio rural.
O Projeto propõe, ainda, uma mudança no que tange à responsabilidade pelos encargos e tributos incidentes sobre o imóvel. A redação original do Código Civil atribuía essas despesas diretamente ao superficiário. Com a nova redação, porém, confere-se maior flexibilidade e liberdade às partes envolvidas, ao permitir que deliberem livremente sobre o rateio dessas responsabilidades. Essa alteração visa proporcionar maior autonomia contratual, permitindo que o superficiário e o proprietário negociem conforme as peculiaridades do caso.
Em resumo, o direito de superfície é uma ferramenta essencial para a utilização eficiente dos imóveis no Brasil, especialmente no meio rural, sem a necessidade de transferir a propriedade. A proposta de reforma do Código Civil visa resolver as questões legais, trazendo inovações e oferecendo mais flexibilidade na distribuição de encargos e tributos, a fim de garantir maior segurança e proporcionar maior autonomia nas negociações particulares e aos contratos que as gerenciam. O CMT seguirá acompanhando a tramitação do Projeto e seus desdobramentos práticos.