“Há uma velha brincadeira de que junto com nossas caravelas foram o idioma e o formalismo jurídico”, brinca o sócio do CMT Lisboa em entrevista para o artigo de capa da Gazeta do Povo
O sócio do CMT Advogados em Lisboa, Fernando Araújo, foi entrevistado por Luan Sperandio para o artigo de capa da Gazeta do Povo: “No país da burocracia, nem médico, nem jogador de futebol. Quem ganha mais é o dono de cartório”. Quando indagado se a custosa burocracia cartorária no Brasil foi herdada de Portugal, Fernando Araújo conta que “há uma velha brincadeira de que junto com nossas caravelas foram o idioma e o formalismo jurídico”.
Conforme a contribuição de Fernando, ainda que possa ser verdade que o Brasil tenha puxado ao notariado lusitano, fato é que, atualmente, Portugal possui um arranjo muito mais desburocratizado do que o brasileiro:
“Foi feito um amplo movimento de simplificação administrativa que tentava evitar burocracias por parte dos notários. Acabamos com o monopólio de certificações, autenticações e reconhecimentos de assinaturas. Diversos serviços que antes eram exclusivos e passaram a ser fornecidos por outras entidades e autoridades”, explicou Fernando Araújo, que também é professor da Universidade Católica de Lisboa.
Com as reformas, por exemplo, os advogados portugueses passaram a poder dar fé pública a atos, autenticação de documentos particulares e tarefas burocráticas simples. Também o registro de imóveis não mais depende dos cartórios quando envolver menor valor. “(…) é comumente feita em cartórios quando os negócios representam maior volume financeiro. Então, na prática o ‘filé mignon’ continua com eles, mas em transações de baixo valor se tornou comum a descentralização, então facilitou muito a vida do cidadão”, disse Fernando Araújo.
Certamente há quem se beneficie da cultura cartorária e, portanto, se oponha à desburocratização. No caso de Portugal, Fernando Araújo apontou que “tabeliões antigos reclamaram muito de perda de receitas, o que indica que havia barreiras artificiais’’ às reformas.
Já no caso brasileiro, Fernando Araújo analisa que “apesar de haver muito interesse em simplificação, o Brasil tem o problema deter muita gente que depende da confusão administrativa. Essas dificuldades artificiais são o ganha pão de milhões de pessoas, então dificulta a aprovação de melhorias. Portugal, nesse sentido, se beneficiou do fato de ser um país menor”. Assim, se por um lado esse pesado formalismo jurídico no Brasil foi herdado de Portugal, essa burocracia é hoje bem menos presente no autor da herança. Diferente dele, nós, os herdeiros, a cristalizamos.
O artigo completo de Luan Sperandio pode ser conferido aqui, abordando essa e outras questões relacionadas à burocracia brasileira.