Em um mundo globalizado, importadoras, exportadoras e operadores logísticos enfrentam desafios crescentes no transporte aéreo de cargas.
Autores: Flávio Alice Martins Costa Velho e Gabriela Vieira Suzin
No contexto internacional, o transporte aéreo de cargas é frequentemente formalizado por meio do Conhecimento Aéreo de Transporte (Air Waybill – AWB), documento que comprova o recebimento da carga, as condições pactuadas e as obrigações de cada parte.
Com a intensificação das relações internacionais, observa-se um aumento significativo no fluxo aéreo, impulsionado pela expansão das atividades comerciais, pela globalização das cadeias de suprimentos e pela demanda por transporte rápido e seguro de mercadorias. Nesse contexto, o transporte aéreo consolidou-se como um componente essencial para o comércio exterior.
Contudo, o desenvolvimento desse setor apresenta desafios, os quais geram discussões relevantes sobre a responsabilidade das transportadoras. Compreender os aspectos dessa responsabilidade é fundamental para operadores logísticos, embarcadores, seguradoras e demais envolvidos na cadeia de transporte.
No transporte internacional, a responsabilidade é regida por uma pluralidade de normas: convenções internacionais, legislações nacionais, regulamentos aeronáuticos e cláusulas contratuais específicas. Essa diversidade requer uma interpretação sistemática e cautelosa, objetivando compatibilizar as normas e assegurar o equilíbrio entre as partes.
A responsabilidade das transportadoras aéreas decorre da violação do dever de guarda e diligência. Enquanto a carga estiver sob sua custódia, a empresa responde pelos danos ocorridos, salvo prova de causa excludente. Essa responsabilidade abrange três hipóteses principais:
- Extravio ou perda – ocorre quando a mercadoria desaparece ou não chega ao destino.
- Avaria – refere-se a danos físicos, deterioração ou violação da carga.
- Atraso na entrega – quando o prazo de transporte é ultrapassado sem justificativa legítima.
Cada hipótese pode gerar obrigações reparatórias específicas, com a quantificação do dano dependendo da natureza da carga, do contrato e dos seguros contratados. No contexto internacional, prevalece o princípio da limitação da responsabilidade, que busca equilibrar interesses econômicos e evitar ônus excessivo à transportadora. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.520.841/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, uniformizou o entendimento, reafirmando a aplicação da Convenção de Montreal e sua prevalência sobre o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor (CDC), consolidando o critério da indenização tarifada.
Embora a decisão possa deixar margem para debates nas instâncias inferiores quanto à aplicação da indenização tarifada ou integral, a Convenção de Montreal é explícita ao prever a indenização integral apenas mediante declaração expressa de valor, acompanhada do pagamento do frete. Dessa forma, mesmo que o transportador disponha de informações que permitam estimar o valor da mercadoria, tal circunstância não dispensa a exigência formal de declaração no Conhecimento Aéreo de Transporte.
Ademais, a responsabilidade abrange outras obrigações principais e acessórias, como a condução segura da carga, o cumprimento de prazos, a emissão e gestão correta do Conhecimento Aéreo de Transporte, a comunicação imediata de incidentes e o respeito às normas aduaneiras e de segurança. Essas obrigações derivam de tratados, legislações e padrões operacionais estabelecidos por entidades internacionais.
Dada a complexidade e os riscos inerentes ao transporte aéreo, os seguros também exercem um papel crucial. Em caso de sinistro, a seguradora efetua o pagamento e sub-roga-se nos direitos do segurado, podendo acionar a transportadora nos limites contratuais ou normativos. No entanto, irregularidades no Conhecimento Aéreo de Transporte, ausência de declaração de valor ou discrepâncias de peso podem comprometer o direito de regresso ou reduzir o montante indenizável.
A discussão sobre a responsabilidade das transportadoras aéreas reflete um equilíbrio entre proteção e eficiência. Por um lado, assegura-se a reparação de danos ao embarcador; por outro, preserva-se a sustentabilidade do setor, evitando indenizações que impactem os custos e a competitividade global. A previsibilidade dos parâmetros permite que as partes ajustem custos, elaborem estratégias de mitigação e adotem medidas preventivas.
A equipe de Contratos do CMT está à disposição para esclarecimentos ou suporte especializado.