O transporte de produtos perigosos é essencial para setores como petroquímico, farmacêutico, energético e agrícola, mas exige rigor técnico e cumprimento da legislação para evitar acidentes graves, danos ambientais e prejuízos operacionais.
Autor: Matheus Felipe C. R. Willers Gil
O transporte de produtos perigosos envolve substâncias que podem ser explosivas, inflamáveis, tóxicas, corrosivas, radioativas ou poluentes, elementos essenciais para o funcionamento de diversos setores da economia, como as indústrias petroquímica, farmacêutica, energética e agrícola. Apesar de sua importância, essa atividade requer extremo cuidado e rigor técnico, pois o manuseio inadequado desses materiais pode comprometer a segurança pública, a saúde dos trabalhadores e o equilíbrio do meio ambiente. Vazamentos, explosões e contaminações são alguns dos incidentes capazes de gerar consequências graves e, em muitos casos, irreversíveis.
No Brasil, o transporte de produtos perigosos é amplamente regulamentado por um conjunto de normas que estabelecem critérios voltados à segurança operacional, ao licenciamento ambiental e à fiscalização das atividades envolvidas. A Lei nº 10.233/2001, em seu artigo 22, inciso VII, atribui à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a competência para regulamentar o transporte de produtos perigosos em rodovias e ferrovias, definindo padrões e normas técnicas complementares aplicáveis a esse tipo de operação.
Entre as principais normas expedidas pela ANTT, destaca-se a Resolução nº 5.998/2022, complementada pelas Resoluções nº 6.016/2023 e nº 6.056/2024. Esses atos normativos disciplinam, dentre outros aspectos, as condições de transporte, a documentação exigida, os deveres, as obrigações e as responsabilidades das partes envolvidas, a fiscalização, bem como as infrações e as penalidades aplicáveis. Essa norma também traz Instruções Complementares que tratam da classificação dos produtos, da certificação das embalagens, da sinalização dos veículos e dos procedimentos de expedição, assegurando que toda a operação ocorra de forma segura e padronizada. Além disso, é necessário observar as normas estaduais sobre a matéria, que complementam a legislação federal, estabelecendo procedimentos específicos para o licenciamento e a fiscalização no âmbito estadual.
O anexo da Resolução nº 5.998/2022 traz a lista oficial dos produtos perigosos, com suas respectivas classificações, regras de identificação, forma correta de embalagem, sinalização dos veículos e a documentação exigida para o transporte.
Em relação à classificação do produto, ela deve ser realizada pelo fabricante, pelo expedidor (orientado pelo fabricante) ou, em alguns casos, pela autoridade competente, com base nas características físico-químicas da substância. Cada produto é enquadrado em uma classe ou subclasse de risco, e o transporte deve seguir as exigências específicas dessa categoria. Os veículos transportadores devem conter painel de segurança e rótulo de risco.
O painel de segurança é uma placa retangular de cor alaranjada fixada no caminhão, contendo números que indicam o tipo de risco e o número ONU, o qual identifica a substância transportada. Já o rótulo de risco, em formato de losango, informa sobre o tipo de perigo e o manuseio adequado, geralmente com cor de fundo, texto e um símbolo que identifica o perigo envolvido.
Ainda, a legislação define uma série de documentos que devem obrigatoriamente acompanhar o veículo durante o transporte de cargas perigosas, garantindo a regularidade da operação e a disponibilidade de informações em caso de fiscalização. São eles:
(i) Os originais do CTPP ou do CIPP e, no caso de transporte a granel, o CIV;
(ii) O documento para transporte de produtos perigosos contendo todas as informações sobre a carga; e
(iii) Outros documentos ou declarações exigidas pelo regulamento.
Além disso, é necessária a Autorização Ambiental para Transporte de Produtos Perigosos, emitida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), nos casos de transporte interestadual de cargas perigosas. Vale ressaltar que a Declaração do Expedidor deixou de ser obrigatória em 1º de junho de 2023, assim como o porte da Ficha de Emergência e do seu Envelope durante o transporte rodoviário. No entanto, o conteúdo dessas informações poderá ser cobrado em ações estaduais de fiscalização, como é o caso da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM/RS).
Outro aspecto importante é a fiscalização do transporte rodoviário de produtos perigosos, realizada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) em todo o país, por meio dos órgãos que integram a Rede Brasileira de Metrologia Legal e Qualidade. Essa fiscalização é feita em parceria com a Polícia Rodoviária Federal, garantindo o cumprimento das normas técnicas e de segurança aplicáveis a esse tipo de transporte. Durante as inspeções, é verificado se o veículo transportador e o equipamento que acondiciona a carga atendem aos requisitos previstos na legislação. Também é conferido se o motorista possui o Certificado de Inspeção para o Transporte de Produtos Perigosos: quando o certificado se refere ao veículo, sua validade é de um ano; quando se refere ao equipamento de transporte, a validade pode variar de um a três anos, conforme o tipo de carga.
Além disso, os órgãos credenciados realizam a verificação metrológica dos equipamentos, que consiste na medição da capacidade volumétrica dos compartimentos utilizados no transporte de produtos perigosos. Vale destacar que essa fiscalização se aplica especialmente aos veículos e equipamentos utilizados no transporte a granel, como os que transportam combustíveis, produtos corrosivos e Gás Liquefeito de Petróleo (GLP).
O conhecimento das normas aplicáveis aos produtos perigosos é essencial para garantir uma gestão segura e responsável, que inclua desde o armazenamento até o transporte e a destinação final dos resíduos. A adoção de boas práticas operacionais é indispensável para minimizar riscos. O uso de embalagens adequadas, devidamente sinalizadas e compatíveis com as propriedades do produto, reduz significativamente a chance de vazamentos e acidentes. Da mesma forma, o respeito às restrições de circulação e o uso de sistemas modernos de roteirização e monitoramento contribuem para um transporte mais eficiente e seguro. Ademais, a sinalização correta dos veículos, com o painel de segurança e o rótulo de perigo em locais visíveis, também ajuda a garantir respostas rápidas em situações emergenciais.
Em síntese, o transporte de produtos perigosos deve ser conduzido com planejamento, capacitação de motoristas e rigor no cumprimento das normas legais e ambientais. O atendimento a essas exigências vai muito além de uma simples obrigação legal: representa um compromisso com a responsabilidade socioambiental e com a sustentabilidade das operações, garantindo que o desenvolvimento econômico ocorra de forma segura e consciente.